Tuesday, November 02, 2004

O Aborto

Absolvida
Juíza alegou que crime da prática de aborto não ficou provado


A jovem de 21 anos acusada da prática de aborto foi hoje absolvida no Tribunal Criminal de Lisboa. A juíza Conceição Oliveira alegou que o crime não ficou provado.
A jovem era acusada de interromper uma gravidez em Janeiro de 2000 e foi denunciada à PSP por um enfermeiro de serviço do Hospital Amadora-Sintra.
Na leitura da sentença, a juíza Conceição Oliveira sustentou a absolvição da arguida alegando que não ficou provada a ingestão dos comprimidos com o objectivo de interromper voluntariamente a gravidez nem que a jovem tivesse conhecimento dos efeitos abortivos do Misoprostol.
A juíza considerou também insuficientes as provas apresentadas em tribunal pela Polícia para concluir que se verificou uma interrupção voluntária da gravidez.
Por sua vez, o procurador-adjunto do Ministério Público, Pinto dos Santos, defendeu que a arguida deveria ser absolvida por não ter sido provada a prática de crime de aborto.
Num comentário à decisão da juíza, a deputada Odete Santos, que assistiu à leitura da sentença, disse aos jornalistas que este tipo de "crimes" normalmente "não tem prova, a não ser em casos excepcionalíssimos". "Porque é difícil provar que havia uma gravidez e que houve um aborto feito intencionalmente", justificou.


Parece-me que este é outro assunto de grande polémica... Em relação a este caso em particular, tenho duas perguntas fundamentais: 1ª - Se só a partir dos 18 anos é que se pode condenar judicialmente alguém (julgo eu), como é que esta rapariga é julgada por um "crime" que supostamente cometeu quando ainda só tinha 17? 2ª - Onde está, neste caso, a confidencialidade médica? Não é suposto, tal como acontece com os advogados e os jornalistas, haver um sigilo profissional? É claro que não estou completamente informada sobre os pormenores que antecederam este julgamento, mas será só impressão minha ou isto não faz muito sentido?
Agora, passando para a questão do aborto no geral, há outros tópicos que não devem ser esquecidos. Lembro-me particularmente de um debate que tive numa aula de Teoria da Comunicação, o ano passado. Saí de lá um pouco (muito) estupefacta com a opinião geral sobre o assunto. Sabia que existia uma grande oposição à legalização do aborto, mas sempre achei que fosse uma posição minimamente fundamentada. O principal fundamento da "personagem" que dirigia a oposição (por iniciativa própria) era o facto de a Igreja Católica ser contra a prática abortiva. Até aí, ainda dá para compreender (ou, pelo menos, faz-se uma tentativa)... Cada um é livre de escolher e seguir a religião que bem entende, não tenho nada contra, muito pelo contrário. O cúmulo foi mesmo quando a "pobre rapariga" ficou "desarmada" por desconhecer por completo certas "verdades indiscutíveis" da sua própria religião, ao ser confrontada com o facto de a Igreja Católica proibir qualquer meio contraceptivo e de considerar que o sexo, para além de só poder ser praticado após o casamento, ser apenas por motivos de "procriação". Agora pergunto: como é que alguém que justifica o "não ao aborto" por motivos religiosos, não conhece sequer os princípios fundamentais da Igreja Católica? Como é que se podem fazer referendos ou debates, se as pessoas não estão minimamente informadas?
Acho que é importante tentar-se fazer entender, de uma vez por todas, que ser a favor da legalização do aborto não é a afirmação de uma pre-disposição para o fazer. Mas sim dar liberdade às mulheres para tomarem as suas próprias decisões, para terem poder sobre o seu próprio corpo e sobre a sua vida, sem medos e sem culpas. Para além disso, é diminuir as "discrepâncias" que existem entre os mais pobres e os mais ricos. Porque ir a Espanha ou a outro sítio qualquer é muito fácil para quem pode, para quem tem poder monetário para isso. E esses fazem-no sem recriminações, sem "dedos apontados". Os que não podem, arriscam: ou deixam a pobre criança nascer para viver numa vida muitas vezes miserável, ou arriscam as suas próprias vidas em abortos caseiros ou nas mãos de pessoas pouco confiáveis. Não é por o aborto ser ilegal, que ele não é feito. Quem o quer realmente fazer, não deixa de o fazer. Então porquê tanta oposição? Porquê tanto preconceito? Será só mesmo por motivos religiosos? E será que quem tem esses motivos só fará sexo para "procriar"? Se sim, tenho pena dessas pessoas... Devem ser realmente muito infelizes.

10 comments:

Alexandre Carvalho said...

bem... tb estranhei algumas coisas... ela tar a ser julgada por uma coisa q fez aos 17 anos é no mínimo... curioso. Qto ao sigilo, o texto diz q ela foi denunciada por um enfermeiro de serviço na altura, o q n significa q era ele q estivesse a tratar da rapariga e q por isso n tivesse nenhumas obrigações de respeitar o sigilo profissional q lhe é imposto AOS SEUS DOENTES... e se quisermos entrar noutro campo, n sei se os enfermeiros terão essas imposições no q ao sigilo profissional diz respeito. Sei q os advogados e os médicos (incluindo psicólogos e psiquiatras) têm, mas n posso precisar sobre os enfermeiros... Mas n q isso interesse aqui. Adiante...
Quanto á questão do aborto, n sei qual a opinião do alexandre caetano (temos q arranjar uma maneira de nos distinguirmos, n te quero tratar sempre como «o outro alexandre» Lol), mas se for parecida á da susana, então estamos mais ou menos em consonância... Também, sou pró-escolha, das coisas q mais me irrita é uns julgarem q são mais importantes q os outros e logo julgam as pessoas pelos seus parametros e tentam obrigar-nos a regermo-nos pelos seus valores. Antigamente havia perseguições religiosas (ainda as há, mas... n interessa para agr). Hoje é um valor mais ou menos adquirido a liberdade de escolha da sua religião. No q respeita a opções sexuais, hetero, homo ou bissexual, caminhamos (acho e espero eu...) no mesmo sentido. Quanto ao aborto, a questão é fundamentalmente a mesma, se bem q engloba n só qustões de índole religiosa, como sexual.
Mas o essencial é, podemos ser contra um valor, mas deveremos obrigar outros q n partilham esse mm valor q nós a segui-lo? N me parece...

Susana Nunes said...

Sinceramente, tenho ideia de que os enfermeiros também estão sujeitos ao sigilo profissional, até porque, pelo que vi, havia muita gente que não entendia por que motivo é que não tinha sido instaurado um processo ao enfermeiro que fez a denúncia. De qualquer maneira, vou ver se descubro se é verdade ou não...

Alexandre Caetano said...

Primeiro. Ou estou muito enganado, ou a lei julga as pessoas pela idade que elas tem, e não pela idade em que cometeram o crime. Depois, sou totalmente contra o aborto a menos os sguintes casos: -Violação e após a ineficácia dos meios anti-contraceptivos disponiveis.
Pronto. Mentes e mentes... A minha é assim e a menos que me mostrem algo que me conforme para mudar a minha opinião.

Susana Nunes said...

Mas tu estás a cair no mesmo erro em que cai a maioria das pessoas. Disse e volto a repetir: ser a favor da legalização do aborto não é, necessariamente, ser a favor do aborto, mas sim da liberdade de escolha individual.
Quem és tu para impedir uma mulher de poder escolher ter uma criança ou não? Tu não sabes o que ela já passou, não sabes quais foram as causas de ela ter engravidado. Porque não poderá ela poder escolher?
Para além disso, esqueceste-te dos casos em que há mal-formação dos fetos...

Alexandre Caetano said...

Eu continuo na minha. Quanto à mal formação dos fetos, também sou contra, até porque as pessoas quando querem ter filhos, têm que se sujeitar ao resultado, não é fazer o aborto, só porque há deficiência...

Susana Nunes said...

Tens a noção que tens uma visão ainda mais antiquado do que o próprio governo português? Como é que podes achar correcto uma mulher ser obrigada a ter um filho, sabendo, à partida, que não vai nascer com as capacidades físicas e/ou mentais mínimas? Que vai ser dependente dela para toda a vida? Porque não te colocas no lugar do próprio feto? Imagina que uma mulher, que realmente quer ter um filho, descobre que o que se está a desenvolver dentro de si própria nunca saberá o que é viver realmente, porque não terá capacidades para isso. Imaginando que os fetos já têm alma, o que preferirias? Não acharias que ela demonstaria um grande acto de amor ao despender do seu sonho e ao poupar o seu filho a uma vida de miséria? Imagina agora que essa mulher até nem se importaria de ter esse filho e que o amaria da mesma forma, sendo "perfeito" ou não, mas que vivia numa condição financeira considerada normal (classe média) ou até mesmo precária. Sabes quanto custa dar as condições mínimas necessárias a uma pessoa "incapacitada", a qualquer nível, e completamente dependente dos outros? Demasiado, acredita. E nã venhas dizer que o Estado dá a sua ajuda, porque toda a gente está bem a par da realidade. O que o Estado dá como ajuda não dá nem para o indispensável.
Outra coisa: como é que se pode negar a liberdade às mulheres, quando os homens a têm toda? Sabes quantas mulheres são abandonadas pelos seus companheiros quando estes descobrem que elas estão grávidas? Não pode isso ser considerado um "aborto psicológico"? Seguindo a tua lógica, não deveria ser isso condenado também? Não apenas socialmente, mas legalmente?
Por fim: os métodos contraceptivos não são 100% eficazes; mulheres que engravidem devido ao rompimento de um preservativo são obrigadas, de acordo com a actual lei, a levar a gravidez até ao fim. Não acredito que sejas daqueles que vão esperar pelo casamento para iniciar a tua vida sexual (se bem que já não me admiraria assim tanto, depois de ler o teus comentários). Assim sendo, e considerando que não queres ser pai tão cedo, irias proteger-te, usando um meio contraceptivo. Agora pergunto: como reagirias a uma gravidez "acidental", com esta idade? Que farias? Não te sentirias injustiçado? Deixarias os teus estudos para ajudar a rapariga a sustentar a criança? Não pensarias, pelo menos, duas vezes?
Sinceramente, começo a achar que tu vives numa realidade à parte.

"A liberdade da mulher começa no ventre."
Simone de Beauvoir

Alexandre Caetano said...

Não... Se houvesse um acidente, a mulher poderia muito bem ainda prevenir a gravidez, através da pilula do dia seguinte. De qualquer maneira se tivesse um filho agora, apoiar-ia a minha mulher, e não deixaria de estudar, porque sei que teria o total apoio dos meus pais caso isso acontecesse. No entanto, mesmo que não tivesse esse apoio dos pais, continuaria a estudar e tentava conciliar com um emprego. Para além que hoje em dia as condições para os novos casais, estão muito mais fáceis.

Susana Nunes said...

Não sei se tens bem a noção, mas nem sempre se dá conta dos acidentes... Quer dizer 9 meses depois torna-se bem evidente, mas imediatamente nem sempre. E a pílula do dia seguinte, para além de ser muito prejudicial à saúde da mulher, também não é 100% eficaz.
Para além disso, estás a ver as coisas numa perspectiva muito individualista: os teus pais têm posses para te ajudar se precisares, mas, como deves saber, isso não é muito comum. E as ajudas e apoios do estado de que falas não são assim tão acessíveis. O Estado pode ter criado esses fundos, mas, para além de estarem a diminuir cada vez mais (ao contrário do que pareces pensar), o próprio Estado põe-lhes tantos entraves que poder-se-ia dizer que só existem na teoria, para não parecer mal.
Por fim, tu que vieste de economia devias ter uma ideia mínima de quanto custa ter um filho. Achas mesmo que um simples part-time chega??

Alexandre Caetano said...

Alguém falou em part-time? Eu estou mesmo a falar de estudar à noite. Pode-se completamente conciliar as coisas, e acredita que o dinheiro existia para o filho.

Susana Nunes said...

Se fosses só tu e a rapariga a financiar, e continuassem a estudar, tenho a certeza de que não chegava. Se fosse assim tão fácil, não seriam feitos tantos abortos, nem seriam abandonadas tantas crianças, nem viveriam tantas na miséria.