Entre nós e as palavras há metal fundente
entre nós e as palavras há hélices que andam
e podem dar-nos a morte violar-nos tirar
do mais fundo de nós o mais útil segredo
entre nós e as palavras há perfis ardentes
espaços cheios de gente de costas
altas flores venenosas portas por abrir
e escadas e ponteiros e crianças sentadas
à espera do seu tempo e do seu precipício
Ao longo da muralha que habitamos
há palavras de vida há palavras de morte
há palavras imensas, que esperam por nós
e outras, frágeis, que deixaram de esperar
há palavras acesas como barcos
e há palavras homens, palavras que guardam
o seu segredo e a sua posição
Entre nós e as palavras, surdamente,
as mãos e as paredes de Elsinore
E há palavras nocturnas palavras gemidos
palavras que nos sobem ilegíveis à boca
palavras diamantes palavras nunca escritas
palavras impossíveis de escrever
por não termos connosco cordas de violinos
nem todo o sangue do mundo nem todo o amplexo do ar
e os braços dos amantes escrevem muito alto
muito além do azul onde oxidados morrem
palavras maternais só sombra só soluço
só espasmos só amor só solidão desfeita
Entre nós e as palavras, os emparedados
e entre nós e as palavras, o nosso dever falar
Mário Cesariny, Pena Capital
Via: dawn of the herd.
4 comments:
Tás pior que o Monteiro. Já levas 3 posts "através" de outros sites...
1º Isto não é nenhuma corrida.
2º Se são bons posts, porque não divulgá-los?
agradeço a «divulgação». se bem que o que conta é o poema em si, não o meu blog. já me resignei ao pouco pessoal que comenta, mas agradeço desde já a vossa participação nele.
Entretanto, é realmente um genial poema. ;)
"palavras diamantes palavras nunca escritas
palavras impossíveis de escrever"
Genial!
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